O jornal Estado de Minas publicou reportagem hoje a respeito dos impactos socioambientais causados pela mineração na cidade de Conceição do Mato Dentro. Há mais de dois anos o Movimento Serras e Águas de Minas vem denunciando os absurdos do processo de licenciamento e implantação da mina na Serra da Ferrugem, primeiro pela MMX do bilionário Eike Batista e depois pelo Anglo Ferrous, que comprou os direitos minerários da MMX.
Todo o processo foi facilitado pelo governo do Estado através do Sistema Estadual de Meio Ambiente, culminando com o questionável decreto de Aécio Neves, que declarou de utilidade pública uma faixa de terras para o mineroduto, de Conceição de Mato Dentro até a divisa do Estado o Rio de Janeiro, antes mesmo do licenciamento ambiental e utilizando legislação da época da ditadura do Estado Novo. O silêncio da imprensa mineira sobre esses fatos não é de estranhar devido às relações entre o governo e a mídia que não divulga nada que possa ferir a imagem do Aécio.
E Caeté que vive, sob muitos aspectos, a ilusória expectativa de implantação da Mina Apolo pela Vale? Que lições pode apreender de Conceição do Mato Dentro, cidade que começa a colher os resultados, a maioria ruins, da imprevidência, falta de visão, supremacia de interesses pessoais e irresponabilidade de seus governantes?
Leia a transcrição da reportagem, reflita e tire suas conclusões:
Terra em transe »
Disputa entre mineradoras e preservação deixa cidade em pé de guerra
Conceição do Mato Dentro pega literalmente em armas para negociar com mineradora britânica
Zulmira Furbino - Estado de Minas
Publicação: 28/03/2010 08:20 Atualização: 28/03/2010 10:36
Explosão na mina do grupo britânico próxima às casas de moradores da cidade: preços de terreno têm sido decididos na bala
Conceição do Mato Dentro – Conceição do Mato Dentro, a capital mineira do ecoturismo, instalada em meio aos biomas da mata atlântica e do cerrado, pode ser considerada, hoje, uma terra sem lei. Localizada na Região Central de Minas, no caminho da Estrada Real, famosa por festas típicas centenárias e por suas belíssimas cachoeiras, integrante do circuito de produção do queijo Serro – tombado como primeiro Patrimônio Imaterial de Minas Gerais pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico (Iepha) –, a cidade vive o dilema entre a preservação de sua vocação cultural e turística e a atividade mineradora, trazida primeiro pela MMX, do bilionário Eike Batista, e agora pelo grupo inglês Anglo Ferrous, que comprou o negócio.
De um lado, a mineração promete engordar o caixa do município por meio do aumento da arrecadação de impostos e do pagamento de royalties em mais de R$ 30 milhões ao ano. De outro, a preocupação com o meio ambiente e com o crescimento sustentado é crescente, já que a cidade está na Serra do Espinhaço. Os pequenos proprietários de terra reclamam que estão sendo pressionados e acuados para vendê-las. A especulação imobiliária rural no município ganhou contornos irracionais, chegando ao conflito armado.
Foi o que ocorreu na comunidade de Água Santa, localizada ao pé da Serra da Ferrugem. Aécio Lopes Vieira, técnico em agropecuária, conta que há três anos Sebastião Simões Pimenta, 46 anos, conhecido como Tião, e sua família, montaram uma barricada armada para impedir a passagem dos carros da Anglo na propriedade onde vivia com a mãe, de 91 anos. A empresa teria dado o troco proibindo-o de usar uma trilha habitual que cortava caminho para um distrito vizinho, o Sapo, também usando homens armados. Felizmente, nenhum tiro foi trocado.
O resultado da escaramuça é que Tião teria conseguido R$ 2,4 milhões pela venda do terreno. O ex-proprietário das terras, porém, fala numa cifra menor: R$ 1,4 milhão. Acredita, contudo, que vendeu barato. “Eu queria ter vendido por R$ 6 milhões”, garante. A polaridade de posições e a cobiça despertada pelas negociações feitas com vizinhos e parentes são um dos ingredientes que alimentam a tensão vivida na região. Depois de vender o terreno, Tião alugou uma casinha vizinha – sem banheiro e sem pia na cozinha – e continua a viver como se não tivesse ganho um tostão. “Ganhei o dinheiro, mas está pior do que antes. Aqui não tem nem banheiro dentro de casa. Não consigo comprar uma terra porque o preço está muito alto”, reclama.
De fato, é impossível saber o preço de uma gleba nas imediações do município. “Antes da mineração, o hectare custava entre R$ 500 a R$ 1 mil. Hoje, a Anglo colocou o preço da área que é prioridade para ela entre R$ 12 mil e R$ 15 mil”, diz Aécio Vieira. Exemplo vivo dessa montanha russa é José Santos Pereira, 78 anos, o seu Zezeco. Há três anos, ele se separou, dividiu suas terras ao meio com a ex-mulher e vendeu sua parte – cinco hectares – para a Anglo por R$ 100 mil. A ex, Maria Soares Pimenta, ficou com sua metade, que vendeu há três meses por nada menos do que R$ 920 mil. Para sua sorte, seu Zezeco só tinha recebido a metade do dinheiro porque esperava a averbação do divórcio para ter acesso ao restante. Agora, vai receber R$ 330 mil no lugar dos R$ 50 mil que tinham ficado para trás.
População teme degradação ambiental e aumento da violência com novas empresas
Enquanto isso, na cidade, a preocupação com o crescimento sustentado causa dor de cabeça até mesmo naqueles que estão ganhando dinheiro com a mudança de foco econômico do município. Em 2008, a reeleição do prefeito, Breno José de Araújo Costa, foi anulada e o mesmo aconteceu com a seguinte, na qual foi eleito o filho do político, Breno Filho. Resultado: a cidade está acéfala. Ocupa o posto interino de chefe do executivo a vereadora e presidente da Câmara, Nelma Lúcia Cirino de Carvalho, que não sabe de cor nem o valor do Produto Interno Bruto (PIB) nem o da arrecadação municipal. Até agora, não há projetos de infraestrutura para preparar Conceição do Mato Dentro para o crescimento que já começou a chegar. “Essa é uma situação nova para mim. Não esperei em nenhum momento assumir a prefeitura. Não foi nada fácil”, desabafa.
O vice-presidente da Associação Comercial e Empresarial de Conceição do Mato Dentro, José Antônio Pimenta Filho, reconhece que a chegada de novas empresas à cidade é um ponto positivo, mas afirma que tentou se aproximar da Anglo para obter dados como o número de trabalhadores que já aportaram no município, porém sem sucesso. “Só a RG (construtora) teria trazido 400 homens. Já são 20 prestadoras de serviço na cidade”, calcula. Ele também tentou promover um encontro de empresários da cidade que atuam em outros locais do Brasil, mas não houve interlocução. “A única parceria com a empresa é o Plano de Desenvolvimento de Fornecedores, mas ele é para inglês ver. A empresa está aqui há cinco anos e nada fez pela cidade”, sustenta. De acordo com ele, a mineração concentra renda, mas beneficia poucos. E ainda traz problemas sociais. “A Anglo está gerando empregos primários, mas nossa periferia tem problemas muito sérios, como alcoolismo e drogas. O índice de violência aqui é muito alto”, diz.
No pico da obra, o número de habitantes da cidade terá saltado de 19 mil para 23 mil pessoas. Por enquanto, de acordo com Carlos Gonzales, diretor de operações da mineradora, são apenas 800 pessoas contratadas pelas empresas prestadoras de serviço. Além disso, há cerca de 50 funcionários diretos da própria Anglo Ferrous. “A empresa não vai implantar em Conceição um projeto que não seja sustentável porque não vou aceitar. Eu sou o dono do projeto. Conceição não será como Itabira”, afirma.
Todo o processo foi facilitado pelo governo do Estado através do Sistema Estadual de Meio Ambiente, culminando com o questionável decreto de Aécio Neves, que declarou de utilidade pública uma faixa de terras para o mineroduto, de Conceição de Mato Dentro até a divisa do Estado o Rio de Janeiro, antes mesmo do licenciamento ambiental e utilizando legislação da época da ditadura do Estado Novo. O silêncio da imprensa mineira sobre esses fatos não é de estranhar devido às relações entre o governo e a mídia que não divulga nada que possa ferir a imagem do Aécio.
E Caeté que vive, sob muitos aspectos, a ilusória expectativa de implantação da Mina Apolo pela Vale? Que lições pode apreender de Conceição do Mato Dentro, cidade que começa a colher os resultados, a maioria ruins, da imprevidência, falta de visão, supremacia de interesses pessoais e irresponabilidade de seus governantes?
Leia a transcrição da reportagem, reflita e tire suas conclusões:
Terra em transe »
Disputa entre mineradoras e preservação deixa cidade em pé de guerra
Conceição do Mato Dentro pega literalmente em armas para negociar com mineradora britânica
Zulmira Furbino - Estado de Minas
Publicação: 28/03/2010 08:20 Atualização: 28/03/2010 10:36
Explosão na mina do grupo britânico próxima às casas de moradores da cidade: preços de terreno têm sido decididos na bala
Conceição do Mato Dentro – Conceição do Mato Dentro, a capital mineira do ecoturismo, instalada em meio aos biomas da mata atlântica e do cerrado, pode ser considerada, hoje, uma terra sem lei. Localizada na Região Central de Minas, no caminho da Estrada Real, famosa por festas típicas centenárias e por suas belíssimas cachoeiras, integrante do circuito de produção do queijo Serro – tombado como primeiro Patrimônio Imaterial de Minas Gerais pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico (Iepha) –, a cidade vive o dilema entre a preservação de sua vocação cultural e turística e a atividade mineradora, trazida primeiro pela MMX, do bilionário Eike Batista, e agora pelo grupo inglês Anglo Ferrous, que comprou o negócio.
De um lado, a mineração promete engordar o caixa do município por meio do aumento da arrecadação de impostos e do pagamento de royalties em mais de R$ 30 milhões ao ano. De outro, a preocupação com o meio ambiente e com o crescimento sustentado é crescente, já que a cidade está na Serra do Espinhaço. Os pequenos proprietários de terra reclamam que estão sendo pressionados e acuados para vendê-las. A especulação imobiliária rural no município ganhou contornos irracionais, chegando ao conflito armado.
Foi o que ocorreu na comunidade de Água Santa, localizada ao pé da Serra da Ferrugem. Aécio Lopes Vieira, técnico em agropecuária, conta que há três anos Sebastião Simões Pimenta, 46 anos, conhecido como Tião, e sua família, montaram uma barricada armada para impedir a passagem dos carros da Anglo na propriedade onde vivia com a mãe, de 91 anos. A empresa teria dado o troco proibindo-o de usar uma trilha habitual que cortava caminho para um distrito vizinho, o Sapo, também usando homens armados. Felizmente, nenhum tiro foi trocado.
O resultado da escaramuça é que Tião teria conseguido R$ 2,4 milhões pela venda do terreno. O ex-proprietário das terras, porém, fala numa cifra menor: R$ 1,4 milhão. Acredita, contudo, que vendeu barato. “Eu queria ter vendido por R$ 6 milhões”, garante. A polaridade de posições e a cobiça despertada pelas negociações feitas com vizinhos e parentes são um dos ingredientes que alimentam a tensão vivida na região. Depois de vender o terreno, Tião alugou uma casinha vizinha – sem banheiro e sem pia na cozinha – e continua a viver como se não tivesse ganho um tostão. “Ganhei o dinheiro, mas está pior do que antes. Aqui não tem nem banheiro dentro de casa. Não consigo comprar uma terra porque o preço está muito alto”, reclama.
De fato, é impossível saber o preço de uma gleba nas imediações do município. “Antes da mineração, o hectare custava entre R$ 500 a R$ 1 mil. Hoje, a Anglo colocou o preço da área que é prioridade para ela entre R$ 12 mil e R$ 15 mil”, diz Aécio Vieira. Exemplo vivo dessa montanha russa é José Santos Pereira, 78 anos, o seu Zezeco. Há três anos, ele se separou, dividiu suas terras ao meio com a ex-mulher e vendeu sua parte – cinco hectares – para a Anglo por R$ 100 mil. A ex, Maria Soares Pimenta, ficou com sua metade, que vendeu há três meses por nada menos do que R$ 920 mil. Para sua sorte, seu Zezeco só tinha recebido a metade do dinheiro porque esperava a averbação do divórcio para ter acesso ao restante. Agora, vai receber R$ 330 mil no lugar dos R$ 50 mil que tinham ficado para trás.
População teme degradação ambiental e aumento da violência com novas empresas
Enquanto isso, na cidade, a preocupação com o crescimento sustentado causa dor de cabeça até mesmo naqueles que estão ganhando dinheiro com a mudança de foco econômico do município. Em 2008, a reeleição do prefeito, Breno José de Araújo Costa, foi anulada e o mesmo aconteceu com a seguinte, na qual foi eleito o filho do político, Breno Filho. Resultado: a cidade está acéfala. Ocupa o posto interino de chefe do executivo a vereadora e presidente da Câmara, Nelma Lúcia Cirino de Carvalho, que não sabe de cor nem o valor do Produto Interno Bruto (PIB) nem o da arrecadação municipal. Até agora, não há projetos de infraestrutura para preparar Conceição do Mato Dentro para o crescimento que já começou a chegar. “Essa é uma situação nova para mim. Não esperei em nenhum momento assumir a prefeitura. Não foi nada fácil”, desabafa.
O vice-presidente da Associação Comercial e Empresarial de Conceição do Mato Dentro, José Antônio Pimenta Filho, reconhece que a chegada de novas empresas à cidade é um ponto positivo, mas afirma que tentou se aproximar da Anglo para obter dados como o número de trabalhadores que já aportaram no município, porém sem sucesso. “Só a RG (construtora) teria trazido 400 homens. Já são 20 prestadoras de serviço na cidade”, calcula. Ele também tentou promover um encontro de empresários da cidade que atuam em outros locais do Brasil, mas não houve interlocução. “A única parceria com a empresa é o Plano de Desenvolvimento de Fornecedores, mas ele é para inglês ver. A empresa está aqui há cinco anos e nada fez pela cidade”, sustenta. De acordo com ele, a mineração concentra renda, mas beneficia poucos. E ainda traz problemas sociais. “A Anglo está gerando empregos primários, mas nossa periferia tem problemas muito sérios, como alcoolismo e drogas. O índice de violência aqui é muito alto”, diz.
No pico da obra, o número de habitantes da cidade terá saltado de 19 mil para 23 mil pessoas. Por enquanto, de acordo com Carlos Gonzales, diretor de operações da mineradora, são apenas 800 pessoas contratadas pelas empresas prestadoras de serviço. Além disso, há cerca de 50 funcionários diretos da própria Anglo Ferrous. “A empresa não vai implantar em Conceição um projeto que não seja sustentável porque não vou aceitar. Eu sou o dono do projeto. Conceição não será como Itabira”, afirma.
Fonte: Estado de Minas. 28/03/2010
Veja também:
-- VIDEOS YOU TUBE:
1-CONCEIÇÃO GUARDE NOS OLHOS:
http://www.youtube.com/watch?v=kLxQjBsvQdo
2-CONCEIÇÃO GUARDE NOS OLHOSI II:
http://www.youtube.com/watch?v=oysDR7sf5RU
3-CONCEIÇÃO GUARDE NOS OLHOSI III:
http://www.youtube.com/watch?v=DRCoXLCeovc